-Vendemos seiscentos ou setecentos carneiros por ano - respondeu Jane - e também umas boas centenas de ovelhas. Mas o dinheiro provém principalmente da lã, claro.
-Não era no dinheiro que eu estava a pensar - redarguiu a rapariga. - Deve ser uma satisfação produzir tão grande quantidade de matéria nutritiva.
-Uma satisfação? ...
-Evidentemente. Não se sente feliz por poder abastecer o mercado de tanta carne?
Jane sorriu.
-Confesso que nunca encarei a questão sob esse aspecto. Limitamo-nos a enviar os animais para o matadouro e, na parte que nos diz respeito, consideramos terminada aí a nossa intervenção, restando-nos apenas depositar o cheque no Banco quando ele nos chega às mãos.
-É um belo trabalho o vosso... belo e útil - declarou Jennifer.
Jane Dorman encarou-a, intrigada. Era a primeira vez que ouvia alguém atribuir valor moral à missão que ela e Jack tinham desempenhado desde a sua chegada à Austrália. Nos primeiros anos haviam-nos olhado com desdém, como se fossem simples provincianos incapazes de ganhar a vida na cidade e que, por isso mesmo, se viam constrangidos a viverem do trabalho da terra. Durante o difícil período que mediara entre as duas guerras, quando o quilo de lã não valia mais que três xelins, nunca ninguém mostrara a preocupação de saber se eles tiravam lucros do negócio ou se, pelo contrário, caminhavam para a ruína. Ultimamente, porém, com a lã dez vezes mais cara, havia muito quem os acusasse de oportunistas, exploradores e outras coisas quejandas. Contudo, ainda ninguém se atrevera a afirmar que o trabalho por eles realizado tinha algum valor social.
Nevil Shute, O País Longínquo, p. 161, Editorial Minerva, Lisboa (sem data, o original é de 1957)
Na imagem activistas da PETA - Pessoas para o Tratamento Ético dos Animais, 2006: "A Nudez É Melhor Que Usar Lã Australiana"
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