Comunicamos por fora e por dentro. Com o corpo, a linguagem e os sentimentos. Chamamos “eu” ou “consciência” à unidade de todas as relações numa percepção global centrada. Mas esta integração é tão vasta que pode incluir a auto-reflexão a que se chama pensar e que usa as palavras. Assim, comunicamos por dentro com tudo, absolutamente, e por fora sobretudo com as outras pessoas. O que pode acontecer, e acontece, é julgar que a comunicação exterior, por palavras, é a única forma de comunicação.
Esta redução do todo a uma parte é característica da ciência. Não é possível investigar tudo, mas quem gosta de investigar e descobrir “coisas” (que são sobretudo relações) devido à própria coerência do pensamento, mas também à íntima relação que as partes têm com o todo, dirá sempre, com alguma razão, que o todo é como a parte que conhece. Se continuar a investigar vai sempre revendo a sua “visão geral” de uma forma mais vasta e então as primeiras ideias surgem-lhe como erros, embora não o sejam senão parcialmente.
De algum modo pode afirmar-se que não há Deus mas não pode negar-se a sua ausência, a sua falta, nem o nosso desejo d’Ele. Porque Lhe daríamos um nome se não estivesse em nós? Se não compreendêssemos o que a palavra nomeia? Porque, enfim, tudo nos é dado e é preciso dar graças por isso. Agradecemos a Deus. Precisamos de agradecer-Lhe porque isso é a alegria! A única verdade.
No entanto, tem que haver convenções básicas para nos entendermos por palavras, exteriormente, mas também no pensamento. Essas convenções são as bases – muito pouco firmes – em que assentam as construções culturais a que chamamos civilizações e atingem uma complexidade inabarcável. É claro que elas não são tão verdadeiras como a Natureza selvagem mas são-nos adaptadas, por isso as prezamos. O que não faz sentido, porém, é julgar que as ilusões que construímos são mais verdadeiras que a Natureza que as torna possíveis, que as permite. E ainda faz menos sentido negar à Natureza selvagem, que fundamenta tudo, o estatuto Divino. Ou negar à existência a pertença à possibilidade incompreensível a que chamamos Deus.
A razão é um nome para uma forma de pensar equilibrada em perpétua adaptação, não é um método. Um método é um molde que adapta a si o que investiga. Por isso é necessário conhecer o método para compreender os resultados. O que não vale é julgar que o que o método não pode adaptar a si não é conhecimento. (É por isto que há tanto insucesso escolar: o que os alunos sabem ou querem saber não é avaliado, apenas o que “devem” saber. Ora aprender é querer, não é dever. É querer e é prazer. Mas este assunto fica para outro dia.)
As civilizações tendem a esquecer que manifestam vontade colectiva, sobretudo quando há alguém que impõe a sua vontade e assim parece destruir ou, pelo menos, negar essa vontade colectiva, que é de toda a gente e não é de ninguém e sustenta a civilização. Que não está mais neste ou ali que naquela ou aqui, ainda que a algumas pessoas seja dado exprimi-la de forma mais clara ou mais profunda ou mais bela ou mais aterrorizadora... etc., etc.
A multiplicidade não cabe num texto. A verdade também não, embora nunca falte, em nada, a verdade. Precisamos de partilhar e valorizar os dons uns dos outros, isso é comunicar. Aquilo a que agora se chama comunicação é circulação de informações escolhidas: espectaculares, que se oferecem como realidade que não são.
2 comentários:
É na conversa que temos com alguém que percebemos a nossa posição sobre determinado assunto. É no conflito de opinião que há um assentamento da opinião – mudança de paradigma por ex: ao nível da ciência.
Fenómenos de pudor e vergonha: desvinculado do domínio jurídico, a refutaçaõ significa a denúncia de si, para si e para o outro (desmascaramento).
A relação que temos connosco: pensamos que somos de determinada maneira e descobrimos que não somos.
Infelizmente, vivemos imersos numa cultura sofistica onde se produzem argumentações postiças.
(podemos ser impermeáveis, refractários à maioria das opiniões, mas na maioria somos determinados por elas, micro organismos, crescemos mo meio de uma cosmovisão; produções de opiniões inculcadas na lucidez de outrem numa perspectiva não interrogada, passiva, que passa a constituir-se como filtro de realidade.
A ideia que temos de nós, dos vegetais, do céu, da terra, etc, é na verdade uma opinião, a doxa já está em nós – assentada – o nosso ponto de vista é influenciavél.
Cada um de nós é uma perspectiva a nível mundial portador de uma doxa, fora de nós, mas com conteúdos não percepcionados.
Perceber que uma primeira impressão pode não passar disso mesmo, encontrar uma folga para perceber que o fenómeno perceptivo é possível.
Analisar a diferença entre conteúdos de verdade e conteúdos de imitação.
O ponto de vista em relação a nós próprios é irreal,
Ou como dizia o outro, ainda vivemos na pré.história do nosso desenvolvimento espiritual – ainda não começámos verdadeiramente a pensar :)
Vejo que gostas de Heidegger :)
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