Em religião e no que se pode chamar a cultura, o negro africano era por assim dizer totalitário, totémico: isto é, desconhecedor do sentimento de personalidade e de individuação. Um negro considerava-se sempre membro de um todo sacral, a comunidade de sangue expressa na tribo ou grupo humano sujeito a uma forma material do mistério - animal, rio, planta - e dela dependente pela prática de ritos colectivos que preenchiam a vida quotidiana: bodas, plantações, colheitas, guerras, funerais. Daí a importância dos gestos em cadeia e dos ritmos desencadeadores da unidade de movimento, bem como dos instrumentos empregados para os realçar e produzir: marimbas, atabaques, colares, braceletes. Daí a excelência da arte negra inscultora da pele e da madeira, a perfeição da dança orgiástica, do canto monótono e profundo que reitera o tema e a intenção.
Vitorino Nemésio, Vida e Obra do Infante D. Henrique, Vertente, Porto, 1984, p. 26
com a seguinte nota: A primeira edição deste livro foi efectuada em 1959, integrada na Colecção Henriquina.
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