"Um parvo houve por bem
Ir correr a Rússia a fundo
Para ver se via o mundo
E dar nas vistas também
*
Pelo caminho encontrou
Duas isbas isoladas
E nem vivalma lá dentro.
Foi ver à cave e que viu?
Uns diabos mafarricos
De bigodes eriçados,
Olhos grandes esbogalhados,
A cabeça muito em bico,
Dedos compridos em garra,
Ali a jogar às cartas,
A chocalharem os dados,
A contarem o dinheiro.
Diz-lhes o Parvo, lampeiro:
«Ora Deus seja convosco!
Convosco, gente de bem!»
*
Isto não lhes caiu bem
Aos diabos, não gostaram
E ao Parvo se agarraram.
Desataram a bater-lhe,
Por pouco que o não esganaram;
Ficou mais morto que vivo,
Só então eles o largaram.
*
Então o Parvo lá voltou
Lavado em pranto pra casa,
E grandes gritos soltava.
Logo a mãe barafustou,
A mulher o insultou
E a irmã acrescentava:
-Que grande burro és, Babine!
És mesmo um parvo chapado!
Não lhes soubeste dizer
O que era mais indicado;
Devias ter dito assim:
«Oh! Deus Nosso Senhor,
Sê maldito, ó inimigo!»
Logo os verias pelas costas,
Nada mais queriam contigo
E era pra ti, grande parvo,
O dinheiro das apostas!
*
-Está entendido, mulheres!
Fica assente, mulher minha,
Lukéria, minha mãezinha
E Tchernava, minha irmã...
Hoje fui parvo, pois fui;
Não o serei amanhã!
(...)"
*
Leão Tolstoi, Babine o Parvo, ilustrado por Claude Lapointe, tradução de Luíza Neto Jorge, Contexto, Lisboa, 1985
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