"Para mim e para meu povo, ler e escrever é uma técnica, da mesma maneira que alguém pode aprender a dirigir um carro ou a operar uma máquina. Então a gente opera essas coisas, mas nós damos a elas a exacta dimensão que têm. Escrever e ler para mim não é uma virtude maior do que andar, nadar, subir em árvores, correr, caçar, fazer um balaio, um arco, uma flecha ou uma canoa. Acredito que quando uma cultura elege essas actividades como coisas que têm valor em si mesmas está excluindo da cidadania milhares de pessoas para as quais a actividade de escrever e ler não tem nada a ver. Como elas não escrevem e não lêem, também nunca serão parte das pessoas que decidem, que resolvem. E quando aceitei aprender a ler e escrever, encarei a alfabetização como quem compra um peixe que tem espinha. Tirei as espinhas e escolhi o que eu queria. Acho que a maioria das crianças que vão hoje para a escola e que são alfabetizadas é obrigada a engolir o peixe com espinha e tudo. É uma formação que não atende à expectativa delas como seres humanos e que violenta sua memória. Na nossa tradição, um menino bebe o conhecimento do seu povo nas práticas de convivência."
Ailton Krenak, do povo Krenak, Brasil
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