«A minha tia Emília levava-me consigo para as aldeolas onde dava aulas: S. Pedro de Valbom, Valdezende... Tempo ainda de iluminação a petróleo, de carros de bois a lamuriar por caminhos primitivos... Acompanhei minha tia nos meus cinco, seis anos.»
«Viajavam numa camioneta incrível, focinhuda, que largava fumo e poeirada e nas subidas gemia que metia dó. De aldeia em aldeia, a camioneta ia parando e em cada paragem apeava-se uma professora, com o respectivo bando à espera. Até que chegava a nossa vez.»
«(...) eu ia ao cinema com a minha tia, já que por esses tempos não havia classificações etárias. Aos nove anos, por exemplo, vi o Hamlet, do Shakespeare, numa admirável adaptação cinematográfica de Lawrence Olivier.»
«À noite, rezávamos o terço. Minha tinha era muito religiosa. Orações, orações... aquilo nunca mais acabava. Depois do rosário propriamente dito, havia que rezar pelas almas dos parentes já falecidos, uma legião interminável, e depois em prol das almas mais abandonadas. Dava-me o sono, mas eu sabia que a seguir vinha o encantamento, porque minha tia contava-me histórias antes de adormecermos. Contava-as como só ela sabia contar. Tinha um dom para contar histórias como nunca vi em mais ninguém.»
«Tomemos como exemplo A Branca de Neve e os Sete Anões, quando a princesa é abandonada na floresta. Minha tia "colocava-me" no local, falava de medos, de ameaças, de rumores sinistros. Usando onomatopeias, introduzia em mim o bracejar lamentoso do arvoredo ao luar, à hora em que pia o mocho. Tinha uma capacidade invulgar para me pôr no local da acção, com todos os sentidos alerta.»
«Era uma aventura, um deslumbramento. Ir às segundas-feiras de Braga para essas aldeias era para mim, criança ávida de descoberta, verdadeira magia, magia pura. Mal nos apeávamos da camioneta, lá estavam os garotos à nossa espera. As miúdas ofereciam à senhora professora ramos de flores silvestres e os rapazitos exibiam-se em gritaria heróica, descalços, limpando o monco (risos) à manga do casaco e deixando nela uma espécie de rasto de lesma...»
«(...) era uma festa. Nós por aqueles caminhitos rumo à escola, à velha escola, minha tia à frente com aquelas flores todas como uma santa num andor. Parecia uma galinha seguida pelos pintos. (Risos). As mocinhas muito compenetradas e sorridentes, os rapazitos aos pinotes, com berros de assustar índios...»
«(...) era uma festa. Nós por aqueles caminhitos rumo à escola, à velha escola, minha tia à frente com aquelas flores todas como uma santa num andor. Parecia uma galinha seguida pelos pintos. (Risos). As mocinhas muito compenetradas e sorridentes, os rapazitos aos pinotes, com berros de assustar índios...»
«Viajavam numa camioneta incrível, focinhuda, que largava fumo e poeirada e nas subidas gemia que metia dó. De aldeia em aldeia, a camioneta ia parando e em cada paragem apeava-se uma professora, com o respectivo bando à espera. Até que chegava a nossa vez.»
«(...) eu ia ao cinema com a minha tia, já que por esses tempos não havia classificações etárias. Aos nove anos, por exemplo, vi o Hamlet, do Shakespeare, numa admirável adaptação cinematográfica de Lawrence Olivier.»
«À noite, rezávamos o terço. Minha tinha era muito religiosa. Orações, orações... aquilo nunca mais acabava. Depois do rosário propriamente dito, havia que rezar pelas almas dos parentes já falecidos, uma legião interminável, e depois em prol das almas mais abandonadas. Dava-me o sono, mas eu sabia que a seguir vinha o encantamento, porque minha tia contava-me histórias antes de adormecermos. Contava-as como só ela sabia contar. Tinha um dom para contar histórias como nunca vi em mais ninguém.»
«Tomemos como exemplo A Branca de Neve e os Sete Anões, quando a princesa é abandonada na floresta. Minha tia "colocava-me" no local, falava de medos, de ameaças, de rumores sinistros. Usando onomatopeias, introduzia em mim o bracejar lamentoso do arvoredo ao luar, à hora em que pia o mocho. Tinha uma capacidade invulgar para me pôr no local da acção, com todos os sentidos alerta.»
Entrevista de Altino do Tojal a «A Página da Educação» em Outubro de 2001. A fotografia de Altino do Tojal veio daqui.
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