Vladimir Kush

Vladimir KUSH, Ripples on the Ocean, (Ondulações no Oceano)

Rumi

A vela do navio do ser humano é a fé.
Quando há uma vela, o vento pode levá-lo
A um lugar após outro de poder e maravilha.
Sem vela, todas as palavras são ventos.

Jalāl-ad-Dīn Muhammad RUMI




sexta-feira, 3 de outubro de 2008

A quem pertence o conhecimento?

Quem ensina as aves a voar e a cantar? Há uma resposta pronta para esta pergunta: é o instinto. O que é o instinto? Vamos enredar-nos em labirintos que, em lugar de aclarar a questão, a tornam impenetrável. Aparentemente há muitas maneiras de esconder o conhecimento. Platão, na alegoria da caverna, mostrou como a cultura serve este mesmo objectivo. Se as pessoas forem fechadas num lugar onde só lhes sejam mostradas representações julgarão conhecer. Se alguém conseguir sair da caverna e voltar para contar o que conheceu será desacreditado.

Como Marco Polo e Fernão Mendes Pinto o foram quando falaram da China: “Fernão, mentes? Minto.”

Aprendemos, adquirimos conhecimento, através do corpo e da mente. Quem já teve uma gata que pariu e viu os gatinhos bebés a aprender a andar, a correr e a saltar tem conhecimento disso. Quem só leu ou viu desenhos e imagens, em fotografias, na televisão ou no cinema, pode falar disso e julgar que tem esse conhecimento, mas não tem.

Até conhecer a neve já tinha lido sobre ela e já a tinha visto em imagens e sabia que era fria. Quando conheci a neve fiquei deslumbrada e gelada mas ainda não conheço a neve como as pessoas que vivem em lugares onde neva. Nenhuma escola, nenhum professor ou professora pode ensinar o que é a neve a quem nunca a viu. Pode-se ensinar, sim, muitas palavras e frases sobre a neve. De modo que é possível, a quem não conhece a neve, falar de tal modo sobre ela que convença uma plateia de que a conhece, enquanto alguém que a conheça pode não encontrar palavras. Será fácil, então, ao orador fazer com que a maioria das pessoas acreditem que quem conhece a neve mas não sabe falar sobre ela não a conhece. Este é o poder das palavras e é por causa deste poder que acreditamos em muitas coisas que não são verdade e não acreditamos em muitas outras que são. A quem pertence o conhecimento?

Se quisermos conhecer a Sibéria e tivermos que escolher um guia faremos asneira em escolher o orador em vez de escolher quem ele humilhou em público.

Santo Agostinho, em “O Mestre” escreveu que ninguém, senão Deus, é Mestre, porque só se aprende com o que Ele nos dá. Porém os seres humanos julgam que podem apropriar-se do que não lhes pertence. Dividem assim o que é de todos de modo a que seja apenas de alguns e privam-se mutuamente de conhecimento como se privam da terra e dos frutos da terra e de amor e de poder.

Alexandre julgava-se e tem sido dito poderoso mas quando perguntou a Diógenes o que queria que lhe desse este limitou-se a pedir-lhe que saísse da frente do Sol e não lhe tirasse o que não podia dar-lhe.

Quem nega o conhecimento alheio e pertence a uma comunidade em que as pessoas mutuamente se convencem que o conhecimento lhes pertence são como Alexandre: fazem sombra...

Assim fazem os modernos com os antigos, os adultos com as crianças, os urbanos com os rurais, os colonialistas com os colonizados, etc. e vice-versa.

Sem comentários: